- Um planejamento estratégico bem definido nos ajuda a reduzir a ansiedade, porém pode nos deixar menos responsivos a eventos não previstos.
- Para construir produto, precisamos nos manter abertos e responsivos ao imprevisível. O Taoísmo é uma filosofia que nos dá pistas de como fazer isso.
- Nossos princípios de cultura buscam colocar a companhia em fluxo criativo, abraçando o erro e o incerto na busca por inovação constante.
Quando fundamos a Uncover em 2020, um dos meus principais focos era a definição de uma estratégia clara e objetiva para a companhia. Isto é: uma sucessão de passos bem definidos que, se executados com excelência, nos levariam à terra prometida.
Por trás dessa pretensão reside o anseio natural por reduzir a sensação de incerteza daqueles que se aventuram em novas veredas. Um bom planejamento estratégico nos ajudaria a manter o máximo de variáveis sob controle, aumentando a previsibilidade de nosso jovem empreendimento.
Triste engano.
Construindo Produto
Desde o início nos posicionamos como uma companhia pautada em tecnologia e escalabilidade de produtos, o que nos demandou meses operando como laboratório de pesquisa e desenvolvimento. Reunimos alguns dos melhores cientistas de dados, designers e engenheiros de software do mercado, interagindo em um constante esforço de descoberta e inovação.
Nosso objetivo comum: construir uma plataforma de dados que finalmente entregue aos tomadores de decisão promessas históricas do data driven marketing, criando o padrão-ouro em análise de ROI, otimização de investimentos e forecasting.
Porém, a cada passo nos deparávamos com um novo desafio técnico que não estava previsto em nosso muito bem delineado planejamento estratégico. Escassez de dados para treinar os modelos, fontes arcaicas, ausência de padrão… logo percebemos que nosso esforço inicial para redução de incerteza seria totalmente em vão diante das forças implacáveis do aleatório.
Mas mais do que isso: para alcançar nossas ambições de produto precisaríamos sustentar por muitos meses um circuito virtuoso de descoberta e inovação, colocando o time em uma harmonia produtiva que pudesse abraçar o incerto em vez de inutilmente tentar se livrar dele.
No afã de controlar ao máximo o destino de nosso negócio, o muito bem diagramado planejamento estratégico logo se tornou um empecilho para a criatividade, nos paralisando diante dos eventos imprevisíveis em vez de abraçar sua inevitabilidade.
Estado de Fluxo
O Taoísmo é uma tradição filosófica chinesa milenar, mas que se popularizou no século XXI por abordar o estado de fluxo (ou flow como é mais conhecido). Trata-se do estado de máximo engajamento da mente humana, em que toda a energia da atenção é colocada em um fazer, sem que nenhuma distração interna ou externa lhe atrapalhe. É um estado especialmente comum para atletas de alto rendimento e artistas, que precisam se livrar de toda distração para alcançar a excelência.
Na abordagem taoísta, a chave para se alcançar o estado de fluxo é transformar a relação com o imprevisível. Em vez de dispersar energia tentando controlar o incontrolável, devemos preservar um modo de trabalho responsivo à mudanças e guiado por objetivos comuns.
Na Uncover, diante dos desafios que se apresentavam na construção do produto, começamos a nos desafiar: será que conseguimos colocar a companhia em uma espécie de flow? Seria preciso adotar uma cultura capaz de receber o imprevisível sem resistência, preservando nossa energia criativa para solucionar os problemas.
Cultura vs. Estratégia
Enquanto a estratégia busca minimizar o imprevisível, a construção da cultura tenta produzir princípios que informam a atuação individual e coletiva diante dele. Para aproximar a companhia de um estado de fluxo, adotamos, consciente e inconscientemente, aprendizados focados em preservar a criatividade diante dos problemas. Aqui estão alguns deles:
Reduzir mecanismos que punem o erro: os sistemas de avaliação de performance individual devem medir a capacidade de lidar com erros de forma autônoma, e não punir o cometimento deles.
Empoderar executores para resolverem problemas de forma independente: se assumimos uma cultura do erro, é preciso que cada um tenha autonomia e poder de agir sem responder a um nível hierárquico superior.
Mostre cedo, e mostre sempre: não devemos esperar as coisas estarem perfeitas para compartilhá-las, pois elas nunca estarão. Precisamos de feedback constante.
Microculturas: é importante e desejável que os pequenos grupos criem identidades próprias, mesmo que isso produza heterogeneidade cultural na companhia. Isso aumenta a sensação de responsabilidade e realização diante dos projetos.
Lá, e de volta outra vez
Nossa jornada na Uncover ainda está bem no início. Estamos, com sorte, saindo das fraldas. A aplicação destes princípios certamente nos ajudou nesta fase inicial a realizar nossas ambições de produto: temos, até o momento, churn zero de clientes e funcionários na companhia, o que possivelmente sinaliza algum sucesso.
Ainda assim, é impossível sabermos se eles serão suficientes para as etapas futuras, em que esperamos crescimento acelerado e ampliação de complexidade.
Saber responder ao imprevisível será, possivelmente, nossa grande força neste processo.
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empreendedorismo / produto / gestão / engenharia